2000–2009
As Ovelhas Que Se Desgarraram São Amadas
Abril 2003


As Ovelhas Que Se Desgarraram São Amadas

Para os pais inconsoláveis que foram justos, diligentes e fervorosos ao ensinarem seus filhos desobedientes dizemos que o Bom Pastor está zelando por eles.

Meus queridos irmãos, irmãs e amigos, minha mensagem nesta manhã é de esperança e alento para aqueles pais inconsoláveis que fizeram o melhor que podiam para criar seus filhos em retidão com amor e devoção, mas sentiram-se desesperançados ao verem seu filho rebelar-se ou ser conduzido para o caminho do mal e destruição. Ao contemplar sua profunda angústia, lembro-me das palavras de Jeremias: “Uma voz se ouviu em Ramá (…) Raquel chora seus filhos; não quer ser consolada quanto a seus filhos”. Para isso o Senhor deixou esta grata certeza: “Reprime a tua voz de choro (…) porque há galardão para o teu trabalho, (…) eles voltarão da terra do inimigo”.1

“Devo começar testificando que a palavra do Senhor aos pais desta Igreja encontra-se na seção 68 de Doutrina e Convênios, nesta admirável instrução: “E também, se em Sião ou em qualquer de suas estacas organizadas houver pais que, tendo filhos, não os ensinarem a compreender a doutrina do arrependimento, da fé em Cristo, o Filho do Deus vivo, e do batismo e do dom do Espírito Santo pela imposição das mãos, quando tiverem oito anos, sobre a cabeça dos pais seja o pecado”.2 Os pais são instruídos a “[ensinarem] seus filhos a orar e a andar em retidão perante o Senhor”.3 Como pai, avô e bisavô, aceito isso como a palavra do Senhor, e como servo de Jesus Cristo insto os pais a seguirem esse conselho da forma mais conscienciosa possível.

“Quem são bons pais? Aqueles que com amor, fervor e sinceridade procuraram ensinar seus filhos por exemplo e por preceito a “orar e a andar em retidão perante o Senhor”.4 Isso é verdade, mesmo que alguns de seus filhos sejam desobedientes ou mundanos. Os filhos vêm a este mundo com seu próprio espírito e seus traços de personalidade. Alguns filhos “desafiariam quaisquer pais sob quaisquer circunstâncias. (…) Talvez haja outros que abençoariam a vida e seriam uma alegria para quase qualquer pai ou mãe”.5 Os pais bem-sucedidos são aqueles que se sacrificaram e se esforçaram para fazer o melhor que podiam em suas próprias condições familiares.

“A profundidade do amor dos pais por seus filhos não pode ser medida. É diferente de todos os outros relacionamentos. Está além até da preocupação com a própria vida. O amor de um pai ou mãe por seu filho é contínuo e transcende os desapontamentos e tristezas. Todos os pais esperam e oram para que seus filhos tomem decisões sábias. Os filhos que são obedientes e responsáveis proporcionam orgulho e satisfação sem fim a seus pais.

“Mas e aqueles filhos que foram ensinados por pais fiéis e amorosos e se rebelaram ou foram conduzidos para o caminho errado? Há esperança? A dor de um pai ou mãe por um filho rebelde é quase inconsolável. O terceiro filho do rei Davi, Absalão, matou um de seus irmãos e também liderou uma rebelião contra o pai. Absalão foi morto por Joabe. Ao saber da morte de Absalão, o rei Davi chorou e expressou desta forma a sua tristeza: “Meu filho Absalão, meu filho, meu filho, Absalão! Quem me dera que eu morrera por ti, Absalão, meu filho, meu filho!”6

Esse amor paterno também é expresso na parábola do filho pródigo. Quando seu filho rebelde voltou para casa depois de ter desperdiçado sua herança numa vida desregrada, o pai matou o bezerro cevado e comemorou a volta do filho pródigo, dizendo a seu filho obediente e ressentido: “Era justo alegrarmo-nos e folgarmos, porque este teu irmão estava morto, e reviveu; e tinha-se perdido, e achou-se”.7

Creio e aceito a declaração consoladora do Élder Orson F. Whitney:

“O Profeta Joseph Smith declarou — e ele nunca ensinou uma doutrina mais consoladora — que os selamentos eternos de pais fiéis e as promessas divinas que lhes foram feitas por seu valente serviço pela Causa da Verdade salvaria não apenas eles próprios mas também sua posteridade. Embora algumas ovelhas venham a desgarrar-se, o olhar do Pastor está sobre elas, e cedo ou tarde elas sentirão os braços da Providência Divina estendendo-se para elas e trazendo-as de volta ao redil. Quer nesta vida ou na vida futura, elas voltarão. Terão que pagar sua dívida para com a justiça; sofrerão por seus pecados; e podem ter que percorrer um caminho espinhoso; mas se ele as conduzir por fim, tal como o penitente filho pródigo, ao coração e lar de um pai amoroso e desejoso de perdoar, a experiência dolorosa não terá sido em vão. Orem por seus filhos descuidados e desobedientes; apeguem-se a eles com sua fé. Tenham esperança e confiança até verem a salvação de Deus”.8

“Um princípio dessa declaração ao qual freqüentemente se dá pouca atenção é o de que eles terão de arrepender-se totalmente e “sofrer por seus pecados” e “pagar sua dívida para com a justiça”. Reconheço que este é o tempo “para preparar-nos para encontrar-nos com Deus”.9 Se o arrependimento dos filhos rebeldes não acontecer nesta vida, será ainda possível que os laços do selamento sejam suficientemente fortes para que eles ainda se arrependam? Em Doutrina e Convênios lemos: “Os mortos que se arrependerem serão redimidos por meio da obediência às ordenanças da Casa de Deus,

E depois de terem cumprido a pena por suas transgressões e de serem purificados, receberão uma recompensa de acordo com suas obras, porque são herdeiros da salvação”.10

“Lembremo-nos de que o filho pródigo desperdiçou sua herança e quando tudo tinha sido gasto ele voltou para a casa de seu pai. Ali foi recebido de volta na família, mas sua herança tinha sido gasta”.11 A misericórdia não roubará a justiça, e o poder de selamento dos pais fiéis somente terá efeito sobre os filhos rebeldes sob a condição de seu arrependimento e da Expiação de Cristo. Os filhos rebeldes que se arrependerem desfrutarão da salvação e de todas as bênçãos que a acompanham, mas a exaltação é muito mais que isso. Ela precisa ser plenamente merecida. Saber quem será exaltado é uma questão que deve ser deixada para o Senhor em Sua misericórdia.

“Há bem poucos cuja rebelião e más ações são tão grandes que “pecaram além da capacidade de arrependerem-se”.12 Esse julgamento também deve ser deixado para o Senhor. Ele disse: “Eu, o Senhor, perdoarei a quem desejo perdoar, mas de vós é exigido que perdoeis a todos os homens.”13

“Talvez nesta vida não nos seja dado compreender plenamente quão duradouros são os laços do selamento de pais fiéis a seus filhos. Pode ser que haja mais fontes de auxílio agindo do que temos conhecimento”.14 Creio que há uma forte atração familiar, tal como a influência de antepassados queridos, que continua conosco proveniente do outro lado do véu.

O Presidente Howard W. Hunter comentou que “o arrependimento nada mais é que a saudade da alma, e o cuidado contínuo e ininterrupto dos pais é o mais claro exemplo do perdão infalível de Deus”. Não é a família a analogia mais próxima que a missão do Salvador procurou estabelecer?15

“Aprendemos muito da arte de ser pais com nossos próprios pais. Meu amor por meu pai tornava-se muito mais profundo quando ele era bondoso, paciente e compreensivo. Quando bati o carro da família, ele foi gentil e disposto a perdoar. Mas seus filhos podiam esperar uma firme disciplina quando havia a menor mentira ou uma violação contínua das regras, principalmente quando desrespeitávamos nossa mãe. Meu pai já faleceu há quase um século, mas ainda sinto muito a falta de poder procurá-lo para um conselho sábio e amoroso. Admito que questionei seu conselho, às vezes, mas jamais poderia questionar seu amor por mim. Jamais quis desapontá-lo.

“Um importante aspecto de se fazer o melhor que podemos como pais é proporcionar uma disciplina amorosa, porém firme. Se não disciplinarmos nossos filhos, a sociedade pode fazê-lo de um modo que nós ou nossos filhos não apreciaremos. Parte da disciplina dos filhos consiste em ensiná-los a trabalhar. O Presidente Gordon B. Hinckley disse: “Um dos maiores valores (…) é a virtude do trabalho honesto. O conhecimento sem trabalho é inútil. O conhecimento com trabalho é talento”.16

“As muito difundidas armadilhas de Satanás estão aumentando, e a criação dos filhos está ficando mais difícil por isso. Os pais, portanto, precisam fazer o melhor que podem e fazer uso de todo auxílio que o serviço e atividade na Igreja podem proporcionar. Se os pais se comportam mal ou se desviam ainda que temporariamente do caminho, alguns de seus filhos podem inclinar-se a usar esse exemplo como desculpa.

Mas há o outro lado da moeda que precisa ser mencionado. Peço aos filhos que não têm um bom relacionamento com seus pais que procurem aproximar-se deles, mesmo que não tenham sido tudo o que deveriam ser. Os filhos que criticam os pais bem fariam em lembrar-se do sábio conselho de Morôni, que disse: “Não me condeneis, em virtude de minha imperfeição, nem a meu pai, por causa de sua imperfeição, nem àqueles que escreveram antes dele; mas dai graças a Deus por ele vos ter manifestado nossas imperfeições, para que aprendais a ser mais sábios do que nós fomos”.17

Quando Morôni visitou o jovem Profeta Joseph Smith em 1823, ele citou o seguinte versículo a respeito da missão de Elias: “E ele plantará no coração dos filhos as promessas feitas aos pais; e o coração dos filhos voltar-se-á para seus pais”.18 Espero que todos os filhos se voltem por fim a seus pais e também a suas mães.

Um maravilhoso casal que conheci em minha juventude teve um filho que se tornou rebelde e cortou relações com a família. Mais tarde na vida, porém, ele reconciliou-se com eles e tornou- se o mais carinhoso e solícito de todos os filhos. Ao ficarmos mais velhos, a influência de nossos pais e avós do outro lado do véu torna-se mais forte. É uma experiência maravilhosa quando eles nos visitam em nossos sonhos.

“É muito injusto ou rude julgar pais conscienciosos e fiéis porque um de seus filhos se rebelou ou se desviou dos ensinamentos e do amor de seus pais. Felizes são os casais que têm filhos e netos que lhes proporcionam consolo e satisfação. Devemos ter consideração por aqueles pais dignos e justos que têm problemas e sofrem com seus filhos desobedientes. Um de meus amigos costumava dizer: “Se você nunca teve problemas com seus filhos, espere mais um pouco”. Ninguém pode dizer com nenhum grau de certeza o que seus filhos farão sob certas circunstâncias. Quando minha sábia sogra via os filhos dos outros comportando-se mal, ela costumava dizer: “Nunca digo que meus filhos não fariam isso porque pode ser que eles estejam fazendo exatamente o mesmo enquanto estou falando!” Quando os pais se lamentam por seus filhos rebeldes e desobedientes, precisamos, com compaixão, abster-nos de “jogar a primeira pedra”.19

Uma irmã da Igreja que não quis se identificar escreveu sobre o sofrimento contínuo que seu irmão causou aos pais. Ele envolveu-se com drogas. Resistiu a todas as tentativas de controle e disciplina. Era mentiroso e desafiador. Ao contrário do filho pródigo, aquele filho errante não voltou para casa por vontade própria. Em vez disso, foi apanhado pela polícia e forçado a enfrentar as conseqüências de suas ações. Por dois anos, seus pais pagaram o programa de tratamento de Bill, que por fim fez com que se livrasse das drogas. Em resumo, a irmã de Bill comentou: “Acho meus pais extraordinários. Eles nunca vacilaram em seu amor por Bill, embora discordassem dele e até odiassem o que ele estava fazendo a si mesmo e à sua vida familiar. Mas eram dedicados à família a ponto de apoiar Bill em tudo que fosse necessário para ajudá-lo a atravessar os momentos difíceis e chegar a uma situação mais estável. Eles exerceram o evangelho de Cristo de modo mais profundo, sensível e amplo, amando alguém que tinha-se desviado do caminho”.20

“Não sejamos arrogantes, mas, sim, agradeçamos humildemente se nossos filhos forem obedientes e respeitarem nossos ensinamentos dos caminhos do Senhor. Para os pais inconsoláveis que foram justos, diligentes e fervorosos ao ensinarem seus filhos desobedientes dizemos que o Bom Pastor está zelando por eles. Deus conhece e compreende seu profundo sofrimento. Há esperança. Sejam reconfortados pelas palavras de Jeremias: “Há galardão para o teu trabalho” e seus filhos “voltarão da terra do inimigo”.21 Esse é meu testemunho e oração, em nome de Jesus Cristo. Amém.

  1. Jeremias 31:15–16.

  2. D&C 68:25.

  3. D&C 68:28.

  4. D&C 68:28.

  5. Howard W. Hunter,“Parents’ Concern for Children”, Ensign, novembro de 1983, p. 65.

  6. II Samuel 18:33.

  7. Lucas 15:32.

  8. Conference Report, abril de 1929, p. 110.

  9. Alma 34:32.

  10. D&C 138:58–59.

  11. Ver Lucas 15:11–32.

  12. Alonzo A. Hinckley, Conference Report, outubro de 1919, p. 161.

  13. D&C 64:10.

  14. Ver John K. Carmack, “Quando Nossos Filhos Se Desencaminham”, A Liahona, março de 1999, pp. 28–37.

  15. The Teachings of Howard W. Hunter, ed. Clyde J. Williams (1997), p. 32.

  16. Teachings of Gordon B. Hinckley (1997), p. 704.

  17. Mórmon 9:31.

  18. Joseph Smith — História 1:39

  19. Harold B. Lee, Decisions for Successful Living (1973), p. 58.

  20. “With Love — from the Prodigal’s Sister”, Ensign, junho de 1991, p. 19.

  21. Jeremias 31:16.