2012
A Melhor Jogadora de Futebol
Março de 2012


A Melhor Jogadora de Futebol

“Ama sempre ao teu irmão, ensinou Jesus” (Músicas para Crianças, p. 39).

Cerrei os punhos, mordi os lábios e chutei a bola que estava rolando em minha direção. Então franzi a testa ao vê-la sair do campo em vez de ir para o gol.

Uma menina chamada Fernanda vinha assistindo a nosso jogo de pé ao lado da cerca. Correu para pegar a bola e, de tão empolgada, tropeçou. Todos riram. Ninguém agradeceu a ela quando arremessou a bola de volta para nós.

Senti-me culpada. Eu sabia que a Fernanda estava com vontade de jogar, mas eu não queria ser a única a convidá-la.

A Fernanda era calada, tinha os cabelos castanhos desarrumados, óculos de lentes grossas e voz esganiçada. Não tinha um único amigo em nossa classe inteira. Não é que eu não gostasse dela: simplesmente nunca tinha falado com ela.

Naquela tarde, nossa professora anunciou que ia mudar nossas carteiras de lugar. Ia fazer um novo mapa de lugares.

A sala fervilhava de emoção. Minha melhor amiga, Laura, e eu sorrimos uma para a outra.

Só então a Caroline se inclinou em minha direção. “Ouvi a Fernanda dizer à professora que quer ficar perto de você. Que horror!”

Sentei-me em estado de choque. “Por que eu?” pensei. Eu nunca tinha sido indelicada com a Fernanda, mas também nunca tinha sido gentil.

“Diga à professora que você não quer se sentar ao lado dela”, cochichou a Caroline. “Caso contrário, ninguém vai querer sentar-se perto de você.”

Olhei para a Fernanda. Ela estava de cabeça baixa. Devia saber o que todos na sala estavam pensando.

Dona Marta, a professora, chamou-me à mesa dela. Eu sabia que a Fernanda era filha de Deus e que Jesus mandou amarmos a todos. Mas se eu fizesse amizade com a Fernanda, todos iam me achar esquisita.

“Quer se sentar perto de quem?” perguntou-me a professora.

“Da Laura”, respondi. Essa foi fácil.

A Dona Marta sorriu. “Estaria disposta a sentar-se perto da Fernanda também?”

Olhei para o chão e disse baixinho: “Prefiro não”.

A professora mostrou-se surpresa. “Tem certeza, Angélica?”

“Tenho”, sussurrei.

No dia seguinte nossas carteiras foram reorganizadas. Sentei-me ao lado da Laura. A Fernanda ficou do outro lado da sala. As duas meninas sentadas perto dela afastaram a mesa para bem longe, assim ela parecia estar sentada sozinha. Estava com cara de choro.

Algumas semanas depois a Fernanda mudou de escola. Uma menina de minha ala estudava naquela escola, e perguntei se já tinha conhecido uma menina nova chamada Fernanda.

“Acho que sim. Como ela é fisicamente?” perguntou ela.

“Ah, é muito calada. O cabelo dela está sempre despenteado e ela usa óculos de lentes grossas. Ninguém de minha turma gostava dela.”

“Sério? Então não deve ser a mesma menina”, disse ela. “A menina novata que conheço é muito divertida. Todos gostam dela. Ela joga futebol muito bem.”

Pensei no dia em que a Fernanda tinha ficado olhando nosso grupinho jogar futebol. Ela só precisava de uma chance e de uma amiga. E eu poderia ter-lhe dado ambas as coisas.

Naquele dia prometi a mim mesma que sempre seria agradável com todos e nunca deixaria uma menina como a Fernanda passar por mim despercebida, sem tentar ser sua amiga.

Ilustração: Brad Clark